Apresentação - Origens do republicanismo moderno
Origens do republicanismo moderno é um divisor de águas nos estudos brasileiros sobre o complexo e multifacetado movimento intelectual do início da modernidade, o humanismo cívico. Esse movimento, que teve lugar na península itálica no século XV, simultaneamente inaugurou as primeiras críticas à autoridade política da Igreja, perscrutou o tema da boa vida nas cidades, retomou a filosofia e a retórica da antiguidade greco-romana, reconsiderou a história humana e recolocou o Homem no centro das mais importantes reflexões civis e, com tudo isso, permitiu que ocorresse todo o esplendor do Renascimento.
Newton Bignotto mostra com muita precisão os marcos fundamentais, dos contextos e dos conceitos, do movimento que abriu as portas para o que viria a ser chamado de Modernidade. Por um lado, se o Renascimento é um acontecimento histórico recheado de inovações e rupturas, muitas das quais conhecidas do grande público, por outro, seus fundamentos teóricos e literários ainda são, sobretudo para leitores brasileiros, um imenso mistério.
Reconstruindo paulatina e criticamente a historiografia sobre o período, o autor avança nas interpretações que identificam os pontos de ruptura mais significativos. Pensadores políticos, historiadores, homens de letras e de ação, com o merecido destaque para Coluccio Salutati e Leonardo Bruni, ganham o contorno preciso, neste livro, daquilo que fez deles inteiramente distinto do passado mais imediato e o mais longínquo. Florença, a cidade privilegiada de todo esse percurso, construiu, e foi construída ao lado desses pensadores, as noções primordiais de governo misto, autogoverno, igualdade cívica e, sobretudo, liberdade. A ação política era o norte de cada texto, a cidadania seu fundamento e ambas conformavam o tropo de época da Vita Activa.
Enganam-se, porém, aqueles que julgam que essa contribuição se restringe aos especialistas. Pelo contrário, malgrado ser, de fato, uma obra voltada para os iniciados no tema, o livro tem sido nos últimos 20 anos uma referência central para iniciantes e experientes em ética e filosofia política renascentista. Por ser uma obra inaugural em língua portuguesa, Newton Bignotto teve o cuidado de combinar uma linguagem acessível ao rigor dos especialistas.
O livro nos brinda, ao fim, com uma verdadeira pérola: um conjunto de textos de época dos mais representativos daquele nascente republicanismo, traduzidos ineditamente para o português pelo autor. Sem humanismo, não parece exagero afirmar, deve-se questionar a possibilidade de um Ocidente moderno. Fora de suas origens, perdese o vigor que lhe é característico.
Luís Falcão
Professor do Programa de
Pós-Graduação em Ciência Política
da Universidade Federal Fluminense