Este é o terceiro volume do selo Memória UFF, ação que teve início por ocasião das comemorações dos 60 anos da Universidade Federal Fluminense (UFF) em 2020 e que ora nos brinda com esta homenagem ao centenário da Faculdade Fluminense de Medicina, que se completará em 2026. A iniciativa conta com o apoio e incentivo da reitoria da universidade, representada na figura do reitor em exercício desde 2018, professor Antonio Claudio Lucas da Nóbrega, e tem como objetivos a produção, divulgação e preservação das histórias e memórias que compõem o passado e o presente desta instituição pública de fundamental papel social.

"Memória institucional e histórias de vida – A Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense pela voz de seus ex-diretores e vice-diretores" é o resultado de um projeto de história oral realizado a partir de entrevistas com esses sujeitos centrais da história da faculdade: seus ex-diretores e vice-diretores vivos que aceitaram livremente contribuir. São eles os narradores dos acontecimentos e conflitos que o/a leitor/a conhecerá nas páginas do livro e poderá interpretar à luz das suas próprias experiências e das instigantes relações entre os diferentes relatos.

Assim como as trajetórias humanas precisam lidar com a morte como parte de suas existências, as instituições estão sujeitas tanto ao desaparecimento físico quanto simbólico, que ocorre quando suas estruturas se mostram superadas, inadequadas às demandas de cada presente. Esta tem sido uma razão fundamental para que suas histórias sejam repensadas constantemente, reforçando e recriando laços de identidade e pertencimento com os sujeitos ao seu redor e com o espírito dos tempos que se sobrepõem. Não é tarefa simples tomar pelas mãos o próprio destino, a vida ordinária é constituída principalmente por hábitos, comportamentos nem sempre reflexivos, mas aprendidos e repetidos (Jelin, 2017). Encontramos nas memórias, porém, uma forma de luta institucional pelo passado, pelos sentidos do passado atualizados no presente em que emergem e de acordo com os futuros que desejam: eis a riqueza do ato de rememorar.

As memórias da Faculdade de Medicina da UFF que compõem este livro abordam as características das trajetórias de cada ex-diretor e vice-diretor no interior da faculdade e do Hospital Universitário Antônio Pedro; as respectivas lembranças dos mandatos executados; as vivências e impressões retrospectivas da relação entre faculdade e hospital, incluindo a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) e o surgimento mais recente da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh); as mudanças curriculares e seus conflitos; impressões do entorno social e político e seus impactos sobre a gestão; as expectativas para o futuro da faculdade e, por fim; o funcionamento da Faculdade de Medicina em meio à pandemia de Covid-19 e seus legados.

O livro clássico de Paul Ricoeur, "A memória, a história, o esquecimento" (2007), é aberto por uma citação de outro filósofo francês, Vladimir Jankélévitch, na qual se lê: “Aquele que foi já não pode mais não ter sido: doravante, esse fato misterioso, profundamente obscuro de ter sido é o seu viático para a eternidade”. Que esta subversão das categorias tradicionais da temporalidade, segundo as quais o passado pode ser comparado a um virar de páginas, estimule a valorização da memória institucional da Faculdade de Medicina da UFF proposta neste livro através da delicada relação com as trajetórias individuais dos seus ex-diretores e vice-diretores. Das pontes descontínuas entre os tempos, propomos uma revisão crítica do ensino médico e da gestão universitária através das relações políticas e interpessoais que atravessam os seus processos decisórios, pelas lentes e lembranças de quem os viveu.

Nashla Dahás
(Organizadora)